Um marco importante contra a corrupção e pela transparência...
Hoje, 29, entra em vigor a Lei
Anticorrupção, que responsabiliza e passa a permitir a punição de empresas
envolvidas em atos de corrupção contra a administração pública nacional e
estrangeira. A legislação é um marco e mais uma importante medida para a
prevenção e o combate à corrupção.
Além das responsabilizações e sanções, a Lei
pretende inibir e prevenir ações corruptas.
Especialistas apontam avanços e problemas da nova Lei Anticorrupção
Entra em vigor nesta quarta feira, 29, a Lei 12.846/13, que prevê a
responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de
atos contra a administração pública por Fausto Macedo e Mateus Coutinho CORRUPÇÃO, JUSTIÇA29.janeiro.2014
http://blogs.estadao.com.br/fausto-macedo
Para Zanon de Barros, lei tem bons propósitos, mas mostra-se perigosa
Bernardo Rocha de Almeida considera que a legislação inova ao
responsabilizar pessoa jurídica independente de seus dirigentes
Luiz Lara ressalta as novas possibilidades de acordo de leniência das
empresas
Rodrigo Chauvet acredita que, com nova lei, empresas serão mais
fiscalizadas e responsabilizadas do que nunca
Advogados e juristas da área do Direito Empresarial consideram que a Lei
Anticorrupção, que entra em vigor nesta quarta feira, 29, promove avanços no
modelo de combate aos malfeitos com recursos públicos, mas também criticam
alguns pontos do texto.
De acordo com o especialista em Direito Empresarial Zanon de Paula
Barros, sócio do escritório Leite, Tosto e Barros Advogados, a nova lei tem bons
propósitos, mas, “mostra-se extremamente perigosa ao estabelecer solidariedade
entre pessoas jurídicas coligadas”. Para ele, a Lei Anticorrupção “mostra-se
iníqua quando responsabiliza por solidariedade as pessoas jurídicas coligadas, e
não é suficientemente clara quanto à responsabilidade solidária das
consorciadas”.
Para o criminalista Marcelo Leal, sócio do escritório Eduardo Antônio
Lucho Ferrão Advogados Associados, “a Lei Anticorrupção pode gerar insegurança
jurídica na medida em que o processo administrativo será decidido pela
autoridade máxima do órgão que o instaurou, cargo normalmente ocupado por
pessoas nomeadas politicamente”.
Na avaliação de Leal, existe risco de que a lei seja usada para atender
interesses políticos ou corporativos. “Como existe um alto grau de subjetividade
na definição do ato de corrupção, a autoridade responsável pelo julgamento pode
‘aliviar’ para um aliado político ou forçar a condenação de um inimigo. O mais
curioso é que a própria Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico
alerta que quanto maior a concentração de poder nas mãos de uma única pessoa,
maior a chance da prática de corrupção. Ou seja, a lei que foi criada para
combater a corrupção traz em seu bojo o próprio germe daquilo que pretende
coibir”, alerta.
Segundo o advogado Bernardo Rocha de Almeida, especialista em compliance
e sócio do Marcelo Tostes Advogados, a legislação inova ao responsabilizar
objetivamente a pessoa jurídica envolvida no ato ilegal ou lesivo,
independentemente da responsabilização de seus dirigentes ou administradores. Ele explica que a empresa pode ser responsabilizada administrativa e
judicialmente. “No âmbito administrativo, além da multa que pode chegar a 20% do
faturamento bruto do último exercício, a empresa poderá arcar com os custos da
publicação da decisão condenatória em meios de comunicação de grande circulação,
em sítio eletrônico, além de ter que afixá-la no local de exercício de sua
atividade, de modo visível ao público – o que prejudicará sua imagem”.
Bernardo de Almeida observa que, judicialmente, a empresa pode ter
confisco de bens, direitos, valores, incentivos e subsídios, suspensão ou
interdição parcial de suas atividades e, até mesmo, dissolução compulsória de
sua personalidade jurídica. Outro advogado especializado em Direito Empresarial, Luiz Lara, sócio da
PLKC Advogados, destaca que a nova lei abre a possibilidade de uma empresa
infratora firmar acordo de leniência com as autoridades, permitindo-lhe
significativa redução das penas, na medida em que cumpra certos requisitos – por
exemplo, manifestando-se preliminarmente a qualquer outra iniciativa ou denúncia
por parte das autoridades ou de terceiros e cessando completamente as práticas
lesivas.
Em relação à responsabilidade objetiva imposta às empresas, Lara adverte
que por esse princípio “nada importa se a empresa se beneficiou ou não do ato
lesivo, nem tampouco se não houve dolo, bastando provar que a corrupção existiu
para que haja punição. Caberá, assim, punição à empresa, mesmo que um
funcionário tenha agido sem autorização de seus superiores”.
Para o especialista em Direito Administrativo Rodrigo da Fonseca Chauvet,
sócio do Trigueiro Fontes Advogados, se a Lei Anticorrupção “sair do papel”, as
empresas serão, mais do que nunca, fiscalizadas e responsabilizadas pelos
prejuízos causados à administração pública. “Quanto a isso, apesar de algumas
nuances dignas de crítica, tal como a previsão de que, no âmbito da União, um
único órgão (a Controladoria Geral da União) irá instaurar, conduzir e julgar o
processo administrativo, merece aplausos a nova norma”, diz.
Chauvet lembra, porém, que simultaneamente à nova legislação, é
necessária uma mudança brusca e contínua de postura da administração pública no
que tange à fiscalização e penalização de seus agentes – políticos, técnicos,
gestores etc.- quando tiverem a sua responsabilidade comprovada em relação aos
atos lesivos que praticarem.
Nova lei obrigará empresa corruptora a devolver todo o dinheiro desviado
Decreto sobre nova legislação que institui a punição às pessoas jurídicas
envolvidas em desvio de recursos prevê que multa mínima aplicada seja de valor
igual ao da vantagem obtida pelo ato ilícito; norma prevê acordo de delação nas
firmas envolvidas
24 de janeiro de 2014
Renata Veríssimo - O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA - Empresas envolvidas em corrupção vão ser multadas em pelo menos valor
igual ao da vantagem obtida pelo ato ilícito. O piso mínimo da punição para quem
desrespeitar a chamada Lei Anticorrupção, que entra em vigor na quarta-feira,
estará previsto em decreto que vai definir a dosimetria para as penas às
empresas corruptas, entre outros itens.
A Lei Anticorrupção ganhou esse apelido por prever, pela primeira vez no País,
punição para pessoas jurídicas envolvidas em corrupção. O governo aposta em
multas pesadas: até 20% do faturamento bruto do ano anterior ao da abertura de
processo administrativo ou valores de até R$ 60 milhões, quando não for possível
medir a vantagem obtida com o pagamento de propinas a agentes públicos ou
fraudes em licitações.
Sancionada em agosto, na esteira dos protestos que pediam redução da tarifa de
ônibus, mas também o fim da corrupção, entre outros, a Lei Anticorrupção precisa
ser regulamentada por decreto em elaboração pela Controladoria-Geral da União
(CGU). O órgão espera mudanças no relacionamento das empresas com o poder
público. A CGU quer estimular a criação de códigos e programas rígidos de
conduta nas firmas que incentivem os funcionários a denunciarem atos de
corrupção.
Em entrevista ao Estado, o ministro Jorge Hage destaca que a grande mudança é a
punição às pessoas jurídicas, independentemente da responsabilização de seus
dirigentes ou de agentes públicos, como ocorria até agora. A pena é sentida não
só no bolso, mas na reputação das firmas: a lei prevê um cadastro de empresas
corruptoras.
Hage antecipou que o decreto que será publicado nos próximos dias trará as
regras para aplicação dos atenuantes e agravantes no cálculo da multa. "Vamos
definir quanto cada componente reduz ou aumenta o valor", disse. O decreto
definirá a fórmula de cálculo da vantagem obtida pela empresa corruptora e a
dosimetria da multa. "Tudo indica que será um sistema parecido com o que está no
Código Penal. Mas a presidente (Dilma Rousseff) é quem vai bater o martelo sobre
a pena base", afirmou Hage.
Compliance. Um dos atenuantes previstos é a criação ou existência de programa de
compliance (integridade), com normas e códigos internos que inibam a prática de
atos ilícitos ou antiéticos e permitam investigação interna. O decreto vai
definir critérios de avaliação do programa de compliance e do manual de boa
conduta das firmas. A CGU quer aferir a eficiência na prática. As empresas terão
de responder a um questionário e, periodicamente, um comitê verificará a
aplicação do código de ética.
A lei também prevê a assinatura de um acordo de leniência, que pode garantir a
redução das penas para as empresas que colaborarem com as investigações. Esse
acordo era permitido em casos de defesa da concorrência - um exemplo é a
formação de cartel, como o que envolve as empresas do setor metroferroviário
Alstom e Siemens -, mas não para corrupção.
Outro ponto será a definição dos procedimentos e prazos para defesa das
empresas. O governo fixará a forma de apresentação de testemunhas, critérios de
celebração do acordo de leniência e procedimentos quando a corrupção ocorrer em
âmbito internacional. Hage informou que caberá à empresa propor o acordo. Para
isso, terá de denunciar as outras firmas envolvidas no processo e não poderá
mais estar envolvida no ato lesivo. "Tem que colaborar plenamente com a
investigação."
A CGU garantirá o sigilo das negociações para a assinatura do acordo. O nome da
empresa será mantido em segredo até que o termo seja firmado. Se as negociações
não chegarem ao acordo, os documentos serão devolvidos à empresa.
'Lei Anticorrupção marca nova fase na luta contra desvios'
Para consultor do Banco Mundial, porém, efeitos da legislação, que entra em
vigor na quarta, serão percebidos em 1 ou 2 anos
25 de janeiro de 2014
Iuri Pitta - O Estado de S.Paulo
Consultor do Banco Mundial para casos de corrupção e lavagem de dinheiro, o
professor e advogado argentino Agustín Flah compartilha do otimismo das
autoridades brasileiras, que esperam um salto de qualidade no combate a
malfeitos contra a administração pública a partir da chamada Lei Anticorrupção.
A nova norma entra em vigor na quarta-feira e prevê multas e restrições
administrativas às empresas que corromperem agentes públicos. Flah explica por
que a lei pode marcar uma nova fase na luta contra a corrupção no Brasil, mas
recomenda paciência: os resultados levarão de um a dois anos para aparecerem.
O sr. diz que essa lei marca uma nova fase na luta contra à corrupção no Brasil.
Por quê?
AGUSTÍN FLAH - Por várias razões. É uma lei bem elaborada, que não se fez às
pressas. Ela segue as convenções internacionais, que vêm desde os anos 1970, com
a FCPA (Lei contra Práticas Corruptas no Exterior, na sigla em inglês), de 1977,
que basicamente pune o suborno de um funcionário público por uma empresa
americana no estrangeiro. Depois veio a UK Bribery Act (Lei Britânica contra a
Propina), com um conteúdo mais amplo, mas que segue essa linha. E agora a lei
brasileira cria responsabilidade para as pessoas jurídicas que praticam
corrupção. Além disso, é um salto de qualidade. Criar uma lei como essa é um
reconhecimento de que a corrupção é um problema e que se está tentando
enfrentá-lo.
A lei brasileira trata de punições administrativas contra as empresas, enquanto
leis de países como Estados Unidos e Reino Unido tratam de forma criminal. Isso
faz diferença?
AGUSTÍN FLAH - Cada país define se trata do assunto como uma questão criminal ou
não. Isso não significa que a punição civil ou administrativa não será tão dura
quanto a criminal. O sistema brasileiro é análogo ao de organismos
multilaterais, como Banco Mundial ou BID (Banco Interamericano de
Desenvolvimento). Se uma empresa comete uma fraude ou corrupção, ela é multada e
impedida de realizar negócios. Há também a previsão de um cadastro (de empresas
punidas), a exemplo do que faz o Banco Mundial. O Departamento de Justiça
americano divulga as empresas condenadas. O dano à reputação de uma empresa é
uma punição dura. Elas não gostam, estão preocupadas com sua imagem, mas é um
fator a mais para não cometer corrupção. É preciso cuidado, respeitar as
garantias da lei, o direito de defesa, mas a transparência é o caminho que o
mundo está tomando.
Algumas das sanções têm sido consideradas duras pelas empresas, como a multa de
20% sobre o faturamento bruto anual. A lei brasileira é tão dura assim?
AGUSTÍN FLAH - Creio que não, me parece que vai em linha com as convenções
internacionais. O Brasil é signatário do Gafi (Grupo de Ação Financeira contra a
Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo), que também prevê multas
relacionadas ao valor da transação. A lei prevê um leque muito amplo para fixar
as sanções, vai de 1% a 20% do faturamento das empresas. A companhia vai ter
direito de defesa, e caberá à autoridade estabelecer uma punição adequada. Sem
falar que a empresa pode tentar um acordo de leniência.
Como os acordos de leniência ajudam a combater a corrupção?
AGUSTÍN FLAH - Faz uns 20 anos que esses acordos têm sido cada vez mais usados.
Nos Estados Unidos, mais de 88% de casos transnacionais de pagamento de propinas
foram resolvidos por acordo, e uma pequena parte foi a juízo. Isso acelera a
resolução dos casos e reduz a carga sobre o Judiciário. Outro ponto é ser um
caminho para reabilitar a empresa, que é obrigada a cooperar e adotar medidas
como programa de compliance (controle interno). Os pontos que costumam ser
criticados são a falta de supervisão dos acordos pelo Judiciário e o fato de
que, na maioria das vezes, a empresa reconhece um delito menor. Cabe ao poder
público verificar caso a caso e, se a empresa não cooperar como deveria, ser
punida.
Com essa nova lei, o Brasil pode dar um salto significativo, por exemplo, em
rankings que medem a corrupção nos países?
AGUSTÍN FLAH - A lei é um sinal muito positivo. Agora, é preciso esperar um ou
dois anos para medir seus efeitos, ver como empresas e poder público vão agir. À
medida que surgirem casos sob a vigência dessa nova lei, vamos poder avaliar os
avanços.